Direito ao grito

Fé é algo inabalável, inquestionável. Quando governantes se tornam deuses, acima do bem e do mal, a democracia é posta em risco. Vigiar, questionar um governo é dever dos cidadãos. Não fazê-lo é negligência. A estratégia de rotular qualquer crítica como burguesa, elitista e reacionária cria uma redoma de proteção ao redor do PT. O mundo não é dividido entre ricões mauzões e pobrezinhos bonzinhos, entre direitistas reacionários e esquerdistas libertários. É muito fácil pregar a liberdade e assumir uma postura autoritária, não permitindo questionamentos, posições contrárias. Do mesmo modo, é muito fácil propagar um discurso comunista e adotar políticas social-democratas. É muito fácil criticar todas as medidas de um governo e conservar a maioria delas.

Quando eu digo que vou votar no Serra, sou, frequentemente, agredida por militantes raivosos. Os mais virulentos me chamam de burguesa, os mais sutis dizem: “Você é uma pessoa esclarecida, como pode?” Ou: “Eu gosto de você assim mesmo!” Eu tenho o direito de assumir a posição política que julgar melhor. Porque sou esclarecida, porque pensei, ponderei, questionei, analisei. Mas, mesmo se assim não fosse. O direito ao voto, à livre escolha, é inalienável. Não sugiro a ninguém que vote no mesmo candidato que eu, sugiro apenas, àqueles que desrespeitam a minha escolha, que não o façam. Sugiro também, que, ao longo do governo, não ajam como militantes apaixonados, cegos aos problemas. Todo governo tem falhas e todos devemos observá-lo e criticá-lo quando necessário, sobretudo, aqueles que o elegeram. Não existiu e nem vai existir presidente Messias, capaz de redimir o Brasil de meio milênio de erros. As melhorias são processuais. Ao que tudo indica o meu candidato não será eleito, mas se ele for, não me eximirei do meu dever de vigiá-lo porque votei nele. Política não deve ser misturada com emoção. Presidentes não devem ser tratados como ídolos ou deuses, mas como servidores do povo.

A quem possa interessar

Como eu disse, minha escolha não foi movida por simpatias ou antipatias. Antes de fazer a minha escolha, comparei discursos e ações. Fiz várias perguntas: Será que uma estatal falida, cabide de empregos, vale mais do que uma empresa privada que jorra lucros, que emprega milhares? Será que o governo atual teria gerado tantos empregos sem as privatizações? (De fato, o governo gerou mais empregos públicos do que deveria, mas esses são onerosos ao Estado e não, lucrativos.) Seria possível o crescimento da economia sem o plano Real, contra o qual o PT se posicionou? Os números de melhoria na educação são mesmo confiáveis e os meus olhos estão me enganando? Afinal, o que tenho visto nas escolas é bem diferente do que pregam as propagandas. Abrir mais vagas nas universidades resolve a questão da educação ou a educação de base deve ser o alvo principal dos investimentos? O apagão da Dilma é menos atacável que o anterior? Casos e casos de corrupção podem ser ignorados, em nome de um “governo para os pobres”? Consumo sem consciência crítica é o suficiente? Sarney e Collor? Já não é incoerência demais? Bom, essas são apenas algumas das perguntas que me fiz antes de fazer a minha escolha. Espero que todos façam muitas perguntas antes de votarem.

Bom, de todo modo, não vou passar o resto da minha vida justificando uma escolha que é só minha. O fato é que eu tenho o direito de votar em quem quiser e o dever de não permitir que me intimidem, menosprezando o meu voto.

Resposta a uma das minhas perguntas

“Em 1997 a Vale estatal pagou à União US$ 110 milhões em impostos e dividendos. Depois de nove anos de privatização, em 2006, essa quantia saltou 23 vezes para US$ 2,6 bilhões. Nesse mesmo período, o número de empregados cresceu cinco vezes, de 11 mil para 56 mil. As exportações triplicaram, de US$ 3 bilhões para US$ 9 bilhões. A produção expandiu de 100 milhões de toneladas para 250 milhões.” (Arquivos da Vale)

Virgínia Costa

P.S. Vírginia é jornalista e mestre em literatura e uma grande amiga, por quem tenho imenso amor e respeito. Recebi este texto por e-mail e achei importante replicar aqui. No próximo post, leia a minha resposta a ela.